Uma das melhores maneiras de expressar um modo de pensar e fazer os exigidos esclarecimentos consiste em aplicar o método de objeções e respostas. Uma excelente apli-cação do referido método foi feita por Santo Tomás de Aquino em sua Suma Teológica. O fato de ele estar preocupado com questões de natureza teológica é irrelevante em relação ao tipo de argumentação de que se serviu para expor seu pensamento. Por isto mesmo, preten-demos fazer uso do mencionado método com vistas a fornecer uma visão sintética do que é o “neoliberalismo”.
Escolhemos as objeções mais freqüentemente veiculadas pela mídia e apresentadas no meio universitário, e temos razões para acreditar que esses segmentos da sociedade são representativos, à medida mesma que são grandes formadores da opinião pública.
Objeção 1: O neoliberalismo é a ideologia da globalização excludente, que serve unicamente aos interesses dos países ricos em relação aos pobres e aos das classes domi-nantes em relação aos das dominadas.
Resposta à objeção 1: Isto que, no jargão universitário e no da mídia, costuma ser chamado de “neoliberalismo” é um rótulo completamente equivocado. O está realmente em jogo é o liberalismo - uma visão de mundo que já conta com três séculos e apresenta uma coerência e uma continuidade, desde as pioneiras concepções de John Locke, Adam Smith e outros até as contemporâneas de Friedrich Hayek, Milton Friedman e outros. Trata-se, portanto, de uma tradição de pensamento e de realizações institucionais na história do Ocidente.
Isto que acabou recebendo o nome de “globalização” é um fenômeno socioeco-nômico resultante de fatores complexos envolvendo o avanço tecnológico dos meios de informação e comunicação, novos arranjos econômicos no plano internacional, etc. O liberalismo foi criado através do pensamento de muitas cabeças pensantes, mas a globaliza-ção não foi obra do acaso nem criada por nenhuma mente humana: Trata-se de uma conse-qüência não-pretendida de diversas ações humanas tanto de caráter isolado como de cará-ter cooperativo.
Coisas como o mercado livre e a competição econômica não geram benefícios para esta ou aquela classe social ou grupo de interesses, porém benefícios, diretos e indiretos, para todos os membros da sociedade. Onde os produtores de bens e serviços competem em condições de igualdade quem ganha é o consumidor dos mesmos, pois os produtores se esforçarão para produzir a melhor qualidade possível e com o menor preço possível, de modo a conquistar a preferência dos consumidores.
Objeção 2: Como explicar, então, que o avanço da globalização tem tornado os pa-íses ricos mais ricos e os países pobres mais pobres?
Resposta à objeção 2: Dados macroeconômicos mostram que os países ricos têm ficado mais ricos e os países pobres menos pobres. Fala-se, por exemplo, no “empobreci-mento do Brasil”, porém tal coisa nunca ocorreu na história. Desde seu início a nação brasi-leira tem ficado gradativamente menos pobre em termos globais. Hoje há uma classe pobre em ascensão vertical para a baixa classe média, e esta classe emergente é mais ou menos o dobro da atual classe média. Digno de nota é o fenômeno do desenvolvimento regional de-sigual: arquipélagos de riqueza (como, por exemplo, as regiões do Triângulo Mineiro, de Ribeirão Preto (SP), Londrina e Maringá (PR) coexistem com bolsões de pobreza absoluta (o Estado do Maranhão, a região do Vale do Jequitinhonha (MG), o Polígono das Secas no Nordeste, etc.).
Objeção 3: O neoliberalismo é uma concepção que apresenta o mercado como uma panacéia capaz de curar todos os males da sociedade, e com isto relega a um plano secun-dário os problemas sociais e humanos.
Resposta à objeção 3: A essência do liberalismo é a liberdade dos indivíduos hu-manos. Todo indivíduo deve ser livre para fazer o que bem entende, desde que, em seus cursos de ação, não produza danos nem riscos de danos - materiais ou morais - para os outros. A liberdade de empreendimento, que caracteriza a iniciativa privada, é um conceito derivado do da liberdade de ação no sentido amplo. Para se expressar devidamente, ela requer um mercado livre, quer dizer: funcionando de acordo com o jogo da oferta e da demanda, sem intervenções governamentais que venham a prejudicar esse mecanismo da ordem espontânea da sociedade. O mercado livre está longe de ser um remédio para todos os males: é, isto sim, a condição básica para a maior prosperidade econômica.
Objeção 4: Como falar em mercado livre quando sabemos que há cartéis e mono-pólios e estes simplesmente anulam a assim chamada “competição em condições de igual-dade”?
Resposta à Objeção 4: O Estado não deve intervir em processos tais como o jogo da oferta e da demanda, mas deve intervir para evitar que determinados fatores prejudi-quem o bom funcionamento do sistema de preços, que constitui a melhor informação eco-nômica a respeito do referido jogo. Por isto mesmo, são necessárias leis que coíbam práti-cas monopolizantes e cartelizantes, e isto porque cartéis e monopólios (estatais ou privados) gozam da capacidade de impor seus preços e competir deslealmente no mercado. O assim chamado “capitalismo monopolista” não é uma decorrência inevitável do sistema capitalista avançado, porém o resultado da ausência de legislação competente e capaz de estabelecer as regras do jogo em que ninguém, nem mesmo o Estado, deve exercer qualquer tipo de controle sobre preços (ou sobre lucros).
Objeção 5: Como defender um sistema como o capitalista, que só apresenta van-tagens para os donos do capital e desvantagens para os trabalhadores explorados?
Resposta à Objeção 5: A história já mostrou sobejamente que o regime econômico baseado na iniciativa privada – isto que K. Marx deu o nome de “capitalismo” – é muito mais eficiente para promover o desenvolvimento econômico do que um regime baseado no controle estatal dos meios de produção. Um dos maiores enganos de Marx foi acreditar que a economia dirigida e planejada por burocratas estatais seria capaz de produzir uma prospe-ridade maior do que a economia nas mãos da iniciativa privada. Como mostrou Ludwig von Mises, no sistema da economia dirigida pelo Estado, a ausência de um sistema de preços inviabilizava o cálculo econômico, de tal modo que era quase impossível a produção aten-der à demanda: produziam-se demais determinados bens e de menos outros.