Meus amigos, as fábulas e as estórias, contos infantis, ao longo do tempo, tiveram, invariavelmente, o dom de, além de encantar seus leitores, propor-lhes ensinamentos, referências, que estimulassem a absorção, ainda que subliminar, da importância, do valor de se buscar comportamentos éticos, responsáveis, bons, generosos, voltados ao bem comum, ao compartilhamento de sentimentos positivos, como a bondade, a amizade sincera, entre tantos outros.
Exatamente por isso, as famílias que tiveram e têm a felicidade de conquistar um mínimo de discernimento, de informação, assim como as escolas que operam a partir de propostas pedagógicas sadias, desde cedo, apresentam aos seus filhos e seus alunos aquelas estórias e fábulas que, se acredita, lhes proporcionarão experiências construtivas, as quais, adequadamente assimiladas, tenderão a se constituir em suporte para sua vida, fazendo deles cidadãos de bem.
Em cada uma delas: A Gata Borralheira; Joãozinho e Maria; A Bela Adormecida; A Branca de Neve, A cigarra e a Formiga; A Raposa e o Corvo, e tantas outras que, com certeza, estão vindo à mente do amigo leitor; exemplos bonitos são destacados e aqueles censuráveis ensejam resultados negativos para os que os praticam.
Mesmo hoje, com a fantástica evolução tecnológica das mídias, a lógica de valorizar e premiar o bom, aqueles “heróis” que fazem o bem, ao tempo em que se pune o vilão, aqueles que praticam o mal, tende a está presente em qualquer veículo de informação para crianças e adolescentes.
Interessante que se registre que, em alguns desses contos, se crie circunstâncias que levem determinado personagem que, num primeiro momento, se comporta de forma incorreta, a, após se conscientizar de seus erros, adotar postura oposta, deixando claro ter aprendido uma lição e não perdendo a oportunidade que se lhe foi dada, numa clara tentativa de sugerir que poderá haver uma segunda chance para que se corrija erros passados. Talvez a estória dos Três Porquinhos e a do Pinóquio sejam emblemáticas nesse caso.
Pois bem, anos atrás, no cenário político do país, surgiu um personagem meio grotesco, inusitado, que começou a ocupar espaço anormal. Naquele momento, achei pertinente tratá-lo por Pinóquio, uma vez que me parecia claro que suas apresentações públicas, ainda que sinalizassem receptividade do público que o assistia, sugeriam que o personagem não tinha estofo, para justificar sua mensagem. Como no conto, em que, diante do público, se parecia ouvir o boneco, que na verdade veiculava as falas de Gepeto, o ventríloquo, no caso do nosso Pinóquio, era razoável que se compreendesse que algum (uns) Gepeto (s), falava (m) por ele.
Também como no conto, em que o sucesso do boneco induziu-o a querer ser gente, na vida real, o novo Pinóquio acreditou que poderia vir a ser Gepeto e passar a falar pelos outros, a decidir pelos outros, a conduzir a vida dos outros.
A vida voltou a imitar a estória, quando o novo Pinóquio, como no conto, acreditou na cantilena dos criminosos e decidiu tomar o mesmo rumo das “Raposas” e dos “Gatos”, na vã expectativa de que no “País dos Beócios”, no local sagrado conhecido como “Campo dos Milagres”, enterrando umas poucas moedas de ouro e regando a terra com dois baldes da água da fonte local, no dia seguinte, encontrariam uma frondosa árvore carregada de incontáveis moedas de ouro.
Não teve o novo Pinóquio escrúpulo de, junto com seus amigos criminosos, reunir o máximo de moedas dos outros, entendendo que quanto mais moedas plantassem, muito mais moedas teriam.
Nesse ponto da estória, o novo Pinóquio fugiu do “script” original, porque não se fez acompanhar de nenhum “Grilo Falante”, que, como sua consciência, o alertasse para os crimes que vinha cometendo, mudasse drasticamente sua conduta e assim, se fazendo merecedor de uma oportunidade de remissão de seus pecados e, agora sim, passando a ser gente.
Como no conto, findou por ser engolido pela “Baleia” da vida real, a Justiça, onde vai ficar pelo restante de sua vida, para que sua história possa, como no conto, servir de exemplo para futuros bonecos que pretendam se transformar em novos Pinóquios.
A contar a favor do personagem desse conto, há que se registrar que este Pinóquio jamais terá lido uma fábula ou qualquer conto infantil, o que, lamentavelmente, não se constitui em atenuante, porque o próprio Pinóquio sempre se jactou de ser, praticamente, semianalfabeto, iletrado.